Bancos temem impacto de novas regras de funding imobiliário

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20/10/2025Referências
Bancos temem impacto de novas regras de funding imobiliário

Os bancos ainda se debruçam sobre as novas regras do crédito imobiliário com funding da poupança, mas a leitura preliminar é que operações de prazos mais longos podem não ser tão atrativas, apurou o Valor. Não é desprezível o risco de que, em vez de incentivar as concessões, o modelo surta o efeito contrário.


O nó da questão está em dois pontos. Um deles é o descasamento entre o prazo habitual dos contratos de financiamento imobiliário, que costuma chegar entre 20 e 30 anos, e o período previsto para o direcionamento de recursos à modalidade. O outro está no teto de 12% ao ano para as taxas de juros cobradas nas operações feitas pelo Sistema Financeiro


Conforme o anúncio feito pelo governo na sexta-feira, a partir de 2027 não haverá mais o direcionamento de recursos da poupança para o crédito imobiliário como acontece hoje. Em vez disso, os bancos terão de captar recursos no mercado - por exemplo, com a emissão de letras de crédito imobiliário (LCI). O dinheiro captado na poupança, mais barato, poderá ser usado livremente, inclusive na concessão de linhas de crédito mais rentáveis para as instituições financeiras. Porém, os bancos terão de destinar um volume equivalente de recursos para o financiamento imobiliário em um prazo determinado, que deve ficar entre cinco a sete anos, dependendo do valor do imóvel.


Do montante que irá para o crédito habitacional, 80% terão de ser feitos no SFH, que tem taxas limitadas a até 12% mais TR. Esse ponto ficou até melhor do que o esperado pelos bancos, já que chegou a ser discutida a possibilidade de que todos os recursos fossem para o SFH e nada para o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que tem juros livremente pactuados.


Ainda assim, nas operações do SFH - que a partir de agora vão financiar imóveis de até R$ 2,25 milhões - o teto de juros cria a seguinte situação: o banco, na prática, terá os recursos baratos da poupança por até sete anos e, no restante do prazo do contrato, dependerá das captações convencionais da tesouraria. Segundo uma fonte, essa situação pode dificultar a gestão de ativos e passivos das instituições financeiras.


No modelo apresentado pelo governo, o descasamento dos prazos funciona como um elemento multiplicador. “Se o banco quiser usar os recursos por mais sete anos, por exemplo, e investir os recursos livremente, precisará fazer uma nova concessão. Isso vai acelerar e aumentar o volume do crédito”, disse Guilherme Mello, secretário da política econômica da Fazenda, a jornalistas. “Obviamente, é interesse do banco fazer o empréstimo, não só para atender os seus clientes, mas também para ter a possibilidade de investir livremente o seu recurso e ganhar com esse diferencial de rentabilidade.”


O entendimento inicial dos bancos privados é que, em um ambiente de Selic baixa, o modelo pode funcionar. Porém, como esse cenário não é garantido no Brasil, o que pode acontecer é uma limitação das concessões.


Há, no entanto, a expectativa de que possa haver melhorias no desenho, já que o governo anunciou que 2026 será um período de testes. A Abecip, associação das instituições financeiras que atuam no crédito imobiliário, não comentou as medidas. A Febraban, por sua vez, deu pistas de que vê necessidade de ajustes. A entidade, que representa os grandes bancos, elogiou as mudanças no funding, mas, sem fazer referência direta ao teto de juros de 12%, disse que as taxas precisam ser “atrativas também para quem empresta”.


“É imprescindível que governo e setor privado atuem de forma conjunta, apoiando novas fontes do crédito imobiliário. Não existe solução única, mas é necessário construir caminhos sustentáveis, com políticas públicas e incentivos que estimulem o desenvolvimento de novos instrumentos financeiros”, disse a Febraban em nota.


A Associação Brasileira de Bancos (ABBC) elogiou a maioria das regras, mas fez uma ressalva sobre o teto de juros de 12%, que tende a limitar a oferta de recursos a poucos agentes. Segundo a ABBC, os estímulos restringem-se a instituições com depósitos de poupança, que têm demonstrado queda nos saldos nos últimos anos, o que limita seus efeitos. “Além disso, o teto de juros de 12% tende a limitar a oferta a poucos agentes e públicos específicos, demonstrando limitação para escoamento de recursos.”


O novo modelo de crédito imobiliário é uma aposta do governo Lula para impulsionar a compra da casa própria pela classe média. Segundo cálculos do Banco Central (BC), a reforma das regras viabilizará R$ 111 bilhões em recursos no primeiro ano - R$ 52,4 bilhões a mais na comparação com o modelo atual. Desse valor adicional, R$ 36,9 bilhões seriam liberados de forma imediata.


Para o BC, as medidas ajudam a enfrentar o desafio da redução da poupança como fonte de “funding” imobiliário vista nos últimos anos. “Não é uma solução paliativa, mas uma mudança estrutural”, afirmou Gabriel Galípolo durante o anúncio.


No desenho anterior, 65% dos recursos da poupança eram direcionados ao crédito imobiliário, 20% ficavam no BC na forma de recolhimento compulsório e outros 15% eram de uso livre pelos bancos. No novo formato, o compulsório cairá para 15% ainda neste ano e diminuirá gradativamente até zerar em uma década. O mesmo ocorrerá com a parcela de uso livre.


O modelo foi desenhado pelo BC em parceria com os Ministérios das Cidades e da Fazenda. Entidades de mercado, como as que representam o setor da construção, participaram das discussões. Haverá uma transição, com plena vigência a partir de janeiro de 2027.

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